sexta-feira, 21 de março de 2008

Guilhotina

Inusitados são os caminhos de um rápido zapping televisivo.

Noite passada, procurando algum programa para assistir, acabei me deparando com um filme diferente. Estava no Telecine Cult, um filme preto e branco, com ares bem antigos.

Por algum motivo, o ator me chamou a atenção. Desconfiei de sua fisionomia, mas o tema, um tanto macabro, não combinava com ele: Charles Chaplin.

Após rápida confirmação no IMDB, pude apreciar um trabalho de quem imortalizou "O Vagabundo", Carlitos, na tentativa de realizar algo diferente de sua mais marcante personagem.

No filme "Monsieur Verdoux", ele interpreta um astuto e cínico assassino, que se casa com mulheres ricas, para depois eliminá-las, fazendo disto seu ganha pão.

Entre algum suspense e pensamentos sinistros, surgem diversos apêndices de questionamentos filosóficos, na mais diversas áreas: livre arbítrio, identidade, adequação social, bondade. O personagem age com acidez e cinismo ao desafiar as convenções sociais.

Chaplin, mesmo interpretando um vil ser humano, deixa escapar diversos momentos de ternura comportamental, através de gestos, sorrisos e pantomimas. É quase uma confissão de sua natureza, de seu eu mais intrínseco, sem conseguir ser controlado. Talvez sua personagem mais marcante o fosse assim, pois revelava muito de seu intérprete.

A história, filmada e transcorrida nos anos 40, me surpreendeu também por um outro detalhe, desta vez histórico. Durante seu decorrer, o personagem é julgado e pode ser condenado a guilhotina! A pergunta foi quase imediata: isso não é coisa da idade média?

E lá vou eu a pesquisar novamente... Não! É mais recente do que eu imaginava. A última decapitação na França ocorreu em 1977! Além disso, o país só aboliu a pena de morte em 1981. São fatos muito recentes para comportamentos tão bárbaros e antigos.

Matar alguém como forma de punição já é uma violência enorme. A decapitação, então, é algo inimaginável em nosso tempo, ficando distante como uma ficção. Ledo engano meu... E logo os franceses, com seus ares de sábios e iluminados.

Esta 'descoberta' foi um corte em minha percepção do amadurecimento de nosso mundo. Estava muito longe de aventar a possibilidade tão recente da aceitação deste tipo de legislação. Vou prestar mais atenção por onde zapeio. Ou talvez me aventure mais ainda...

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